Sempre que o convocavam para um evento esportivo, seja ele qual fosse, jamais respondia negativamente. Mesmo que fosse para jogar truco valendo o toba.
Competitivo. Essa era a definição correta dele, o Cacá. Adorava competir, mesmo que fosse apostar corrida com sua vó que andava apoiada, ora numa muleta, ora em um andador. Ele esquecia as limitações da pobre velha e corria (ou andava) o suficiente para chegar à frente dela, tudo pelo prazer de ganhar.
Certo dia o convidaram para uma partida de futebol, seu esporte predileto, diga-se de passagem e ele aceitou mesmo sem saber quem seriam os adversários. O convite havia sido feito pelo "Zé" seu amigo desde a primeira série e parceiro de esportes.
Chegando no local do jogo, Cacá foi apresentado para o grupo e ele começou seu exercício de observação silenciosa de seus futuros adversários:
- Acho que esse é meia, pelo jeito de andar...
- Xiiii...esse aí deve jogar de fixo, "fixo na copa" pelo barrigão;
- Esse é boleiro....essa chuteira branca R9 é de boleiro...é ele que eu quero marcar...
E assim foi, analisando um a um e montando sua estratégia de jogo, solitariamente, num canto do bar, sentado numa cadeira de plástico em volta de mesa idem enquanto o Zé contava piadas e fazia o tempo passar.
Enquanto todos preparavam-se para entrar em campo, Cacá continuava em sua análise individual até a hora em que começou a divisão dos times. Ele sabia que o Zé era ruim de bola, que estava ali mais por ser organizador do que atleta e por sua condição de dono da bola o que lhe concedia o direito de sempre começar escolhendo o time. E o escolheu.
Até então, ele não tinha idéia de quem seriam seus adversários: o canhota de ouro, o "Riva" (o cara que tinha as pernas tortas como as do Rivelino), o Robinho (o fazedor de "graça) ou o "fixo" que era quem ele mais temia em ter como companheiro. E o Zé o surpreendeu escolhendo justamente ele como seu parceiro de ataque. Daí ele começou a suar frio.
As escolhas começaram a se suceder e o Zé, como que propositadamente, ou como se soubesse de sua peneira mental, tratou de escolher todos aqueles que Cacá mais temia tê-los em seu time.
- Só poder ser sacanagem!! - pensou ele.
A escolha findava e nenhum daqueles que ele considerava ter "futebol à sua altura" fazia parte do plantel escolhido, meticulosamente, pelo Zé, à quem ele queria esganar.
No final da escolha perceberam a falta de um jogador, o Moisés (o nome verdadeiro dele era Nando, mas a turma o apelidou de Moisés por fazer milagres em campo) e ele não imaginava quem seria o tal "Moisés". Até ele chegar.
Nando e Cacá estudaram na mesma escola, desde o primeiro grau até o segundo, quando deixaram de se encontrar já que escolheram faculdades diferentes: Nando foi fazer Educação Física e Cacá optou pela Economia, seguindo os passos de seu pai.
Enquanto estudaram juntos, eles eram conhecidos como Tom & Jerry, pois um vivia caçando o outro, havendo assim um revezamento entre os personagens.
Participaram de todos os torneios realizados pela escola em todos os esportes possíveis: vôlei, handebol, futebol, taco-bola, pião, dominó e até técnicos de times femininos da escola eles foram, tudo em nome da competitividade.
Mas além disso eles tiveram uma outra disputa, longe das quadras e redutos esportivos. Essa disputa tinha cabelos compridos e escuros, olhos verdes, corpo sinuoso e se chamava Maria Eduarda.
A Duda havia sido a primeira namorada do Cacá, desde a 7a. série até meados do 3o. ano do segundo grau. E foi a partir daí que ele passou a odiar, oficialmente, o Nando.
Em uma daquelas festas de escola, onde todo o colégio se reune em boates nem sempre badaladas e que há a escolha do rei e rainha, os olhares de Duda e Nando se cruzaram. E como Cacá estava viajando com o o time de hóquei sobre patins da sua rua para jogar em Curitiba, o caminho para a investida de Nando em Duda estava aberto. E ele foi. E ficou.
Ao retornar da viagem (onde ele havia perdido o campeonato e estava visivelmente chateado), descobriu o ocorrido e a partir dali, nunca mais olhou pro Nando e a Duda.
Quando o Nando entrou na quadra, Cacá estava fazendo a sua amarração da sorte na chuteira: os cadarços passam por baixo, na sola da chuteira, e são amarrados em cima. Mania adquirida desde os tempos em que jogava com seus Kichutes. E ao levantar a cabeça e ver Nando todo sorridente, cumprimentando um a um, um filme passou em sua cabeça: buscou em seus registros os números de todas as disputas travadas com Nando, quantos gols ele havia feito, número de faltas, assistências, defesas, rebotes, nro. de dobradas, e claro, a perda da Duda.
Olhando em sua volta, para aquele que era o seu time, ou melhor, o time do Zé do qual ele apenas fazia parte, concluiu que talvez fosse melhor se não tivesse aceito o convite para aquele jogo.
E tomou uma decisão.
Desamarrou suas chuteiras, abanou para a turma e foi embora sorridente, afinal de contas, sua última derrota para o Nando havia sido a Duda, mas não no esporte.
E assim seria.
Pra sempre.
3 comentários:
Bã!
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Poutz... achei que ele ia botar a bola na boca do cara, pegar a mina de novo e na hora que ela se pelasse...
Ele mandaria ela se vestir e voltar pro outro, sem comê-la... pra humilhar a ela e, juntamente, ao outro.
Rodrigão, o corno vingativo...
Que boiola, correu do cara que chifrou ele... se fosse eu furava a barriga do cara com uma cabeçada!
Hahahaha...
Abraço, acabamos de chegar agora da primeira partida da final da liga do Beisebol daqui... show de bola, nunca imaginei que fosse tão legal!
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